- Fraqueza, porque "Cristo" pode ser facilmente destruído por "Jesus". Será fácil admitirmos que Jesus existiu, mas que não era "Cristo", nem "filho de Deus".
- Força, porque a fé que permite vencer a inverosimilhança só pode ser uma operação intelectual e espiritual poderosa.
Esta fraqueza e esta força estão presentes na realidade do cristianismo hoje em queda na Europa, sob o assalto dos tais critérios de veracidade, expande-se vigorosamente na Ásia, na África e na América, sendo a religião de cerca de um terço da população mundial.
Mas mesmo na Europa adivinha-se uma porta de regresso que (pelo que vai dizendo) Bento XVI parece querer explorar. É que a inverosimilhança da história de Cristo pouco fica a dever a certas inverosimilhanças opostas. Quem recusa militantemente a existência de Deus, fá-lo por fé. Não porque, de acordo com os critérios de veracidade de que se reivindica, tenha demonstrado que Deus não existe ou que é falsa a sua materialização em Jesus. Tal como o cristão acredita em Cristo, o ateu não acredita em nada transcendente. Mas a fé não o abandonou, e nesse processo ele vai substituindo a inverosimilhança divina por coisas ainda mais inverosímeis. O ateu ocidental, sem o saber, herdou do cristão a noção de salvação e de fim da História (o "Reino de Deus"). Mas incapaz da fé em Deus transfere-a para ídolos, como a ciência, a economia ou a política. Acredita na salvação, mas na terra, e que a ciência, a economia e a política são os instrumentos para a concretizar.
A percepção crescente da incapacidade destes ídolos para construírem o tal "Reino de Deus" tem feito aumentar o número daqueles para quem já nem sequer eles salvam. Daqui nasce a crendice. É no Ocidente super-racionalista que assistimos a uma verdadeira explosão das mais folclóricas superstições, desde a astrologia à psicanálise. Não surpreenderá, por exemplo, vermos um físico nuclear acreditar na reencarnação ou no poder das actividades mediúnicas.
Bento XVI (como já antes João Paulo II) parece acreditar na ideia de Dostoievsky segundo a qual a vida pós-religiosa, sem mistério, seria insuportável. A explosão de formas abastardadas de espiritualidade aponta, justamente, para aí. A Igreja pensará talvez herdar esta sede de mistério, assim reconquistando a Europa. É provável que tenha razão. Afinal, ainda não deixámos de celebrar anualmente o mistério da vida de Jesus, nem de nos render a ele, por muito alheios que a ele sejamos. Por isso, feliz Natal.
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