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segunda-feira, março 29, 2010

Sacerdotes pedófilos: um pânico moral

Por que motivo se volta a falar de sacerdotes pedófilos, com acusações que remontam à Alemanha, a pessoas próximas do Papa, e talvez mesmo ao próprio Papa?
A sociologia tem alguma coisa a dizer sobre isto, ou deve deixar o assunto exclusivamente ao cuidado dos jornalistas?
Parece-me que a sociologia tem muito a dizer, e que não deve calar-se por receio de desagradar a algumas pessoas. Do ponto de vista do sociólogo, a actual discussão sobre os sacerdotes pedófilos constitui um exemplo típico de «pânico moral». O conceito surgiu nos anos 70 do século XX, para explicar a «hiperconstrução social» de que alguns problemas são objecto; mais precisamente, os pânicos morais foram definidos como problemas socialmente construídos, caracterizados por uma sistemática amplificação dos dados reais, quer a nível mediático, quer nas discussões políticas. Os pânicos morais têm ainda duas outras características:
  • em primeiro lugar, problemas sociais que existem desde há várias décadas são reconstruídos, nas narrativas mediáticas e políticas, como problemas «novos», ou como problemas que foram objecto de um alegado crescimento, dramático e recente;
  • em segundo lugar, a sua incidência é exagerada por estatísticas folclóricas que, embora não confirmadas por estudos académicos, são repetidas pelos meios de comunicação, podendo inspirar persistentes campanhas mediáticas.

Por seu turno, Philip Jenkins sublinhou o papel dos «empresários morais», pessoas cujos interesses nem sempre são óbvios, na criação e na gestão destes pânicos. Os pânicos morais não fazem bem a ninguém; distorcem a percepção dos problemas, comprometendo a eficácia das medidas destinadas a resolvê-los. A uma análise mal feita não pode nunca deixar de se seguir uma intervenção mal feita.

Sejamos claros: na origem dos pânicos morais estão condições objectivas e perigos reais; os problemas não são inventados, as suas dimensões estatísticas é que são exageradas.

Numa série de interessantes estudos, Philip Jenkins mostrou que a questão dos sacerdotes pedófilos é talvez o exemplo mais típico de pânico moral; com efeito, estão aqui presentes os dois elementos característicos desta situação: um dado real de partida, e um exagero deste dado por obra de ambíguos «empresários morais».

  1. Comecemos pelo dado real de partida. Há sacerdotes pedófilos. Alguns casos, repugnantes e perturbadores, foram alvo de condenações peremptórias, e os próprios acusados nunca se declararam inocentes. Estes casos – passados nos Estados Unidos, na Irlanda, na Austrália – explicam as severas palavras proferidas pelo Papa, bem como o pedido de perdão que dirigiu às vítimas. Mesmo que se tratasse apenas de dois casos – ou de um só –, seriam sempre demais; contudo, a partir do momento em que não basta pedir perdão – por muito nobre e oportuna que tal atitude seja –, sendo preciso evitar que os casos se repitam, não é indiferente saber se foram dois, ou duzentos, ou vinte mil. Como também não é irrelevante saber se os casos são mais ou menos numerosos entre os sacerdotes e os religiosos católicos do que entre outras categorias de pessoas. Os sociólogos são muitas vezes acusados de trabalhar com a frieza dos números, esquecendo que, por detrás dos números, se encontram pessoas; acontece porém que, embora insuficientes, os números são necessários, porque são o fundamento de uma análise adequada.
  2. Para se compreender como é que, a partir de um dado tragicamente real, se passou a um estado de pânico moral, é pois necessário perguntar quantos são os sacerdotes pedófilos. Os dados mais amplos sobre esta matéria foram recolhidos nos Estados Unidos onde, em 2004, a Conferência Episcopal encomendou um estudo independente ao John Jay College de Justiça Criminal da Universidade de Nova Iorque, que não é uma universidade católica e que é unanimemente reconhecida como a mais autorizada instituição académica americana em criminologia. De acordo com este estudo, entre 1950 e 2002, 4392 sacerdotes americanos (num total de 109.000) foram acusados de manter relações sexuais com menores; destes, pouco mais de uma centena foram condenados pelos tribunais civis. O reduzido número de condenações por parte do Estado deriva de vários factores. Em alguns casos, as vítimas – efectivas ou presumidas – acusaram sacerdotes que já tinham morrido, ou cujos alegados crimes já tinham prescrito; noutros casos, a acusação e a condenação canónica não corresponde à violação de nenhuma lei civil, como acontece, por exemplo, em diversos estados americanos em que o sacerdote tenha tido relações com uma – ou mesmo com um – menor com mais de dezasseis anos que tenha consentido no acto. Mas também houve muitos casos clamorosos de sacerdotes inocentes que foram acusados, casos que se multiplicaram na década de 1990, quando alguns escritórios de advogados perceberam que podiam arrancar indemnizações milionárias na base de simples suspeitas. Os apelos à «tolerância zero» justificam-se, mas também não deve haver tolerância relativamente à calúnia de sacerdotes inocentes. Acrescento que, relativamente aos Estados Unidos, os números não mudariam de forma significativa se lhes juntássemos o período de 2002 a 2010, porque o estudo do John Jay College já fazia notar o «notável declínio» do número de casos observado no ano 2000. As novas investigações foram muito poucas, e as condenações pouquíssimas, devido às rigorosas medidas introduzidas, quer pelos bispos americanos, quer pela Santa Sé.

    O estudo do John Jay College afirma, como muitas vezes se lê, que 4% dos sacerdotes americanos são «pedófilos»? Nem pensar. De acordo com o referido estudo, 78,2% das acusaçõesque já ultrapassaram a puberdade. Ter relações sexuais com uma rapariga de dezassete anos não é certamente um acto de virtude, muito menos para um sacerdote; mas também não é um acto de pedofilia. Assim, os sacerdotes acusados de pedofilia efectiva nos Estados Unidos foram 958 em cinquenta e dois anos, ou seja, dezoito por ano; as condenações foram 54, ou seja, pouco mais de uma por ano, referem-se a menores
  3. O número de condenações penais de sacerdotes e religiosos noutros países é semelhante ao dos Estados Unidos, ainda que não exista, relativamente a nenhum país, um estudo completo como o do John Jay College. Na Irlanda, são frequentemente citados relatórios governamentais, que definem como «endémica» a presença de abusos nos colégios e orfanatos (masculinos) geridos por algumas dioceses e ordens religiosas, e não há dúvida de que houve casos de gravíssimos abusos sexuais de menores neste país. Uma análise sistemática destes relatórios permite contudo perceber que muitas das acusações dizem respeito à utilização de meios correctivos excessivos ou violentos. O chamado Relatório Ryan, de 2009, que recorre a uma linguagem muito dura no que diz respeito à Igreja Católica, assinala, em 25.000 alunos de colégios, reformatórios e orfanatos, no período analisado, 253 acusações de abusos sexuais por parte de rapazes e 128 por parte de raparigas (e nem todas são atribuídas a sacerdotes, religiosos ou religiosas), de natureza e gravidade diversas, raramente referidas a crianças pré-púberes e que ainda mais raramente conduziram a condenações.
  4. As polémicas das últimas semanas, relativas à Alemanha e à Áustria, expõem uma característica típica dos pânicos morais: apresentar como «novos» factos ocorridos há muitos anos ou, como em alguns casos, conhecidos parcialmente há mais trinta anos. O facto de eventos ocorridos em 1980 terem chegado à primeira página dos jornais apresentados como se tivessem acontecido ontem – e com particular insistência no que diz respeito à Bavária, a área geográfica de onde o Papa é originário –, e de deles resultarem violentas polémicas, com ataques concentrados, que todos os dias anunciam, em estilo gritante, novas «descobertas», mostra claramente que o pânico moral é promovido por «empresários morais» de forma organizada e sistemática. O caso que – de acordo com os títulos de alguns jornais – «envolve o Papa» é um caso de manual; refere-se a um episódio de abusos que teve lugar na Arquidiocese de Munique da Baviera e Freising, da qual era Arcebispo o actual Pontífice, e que remonta a 1980. O caso veio à luz em 1985 e foi julgado por um tribunal alemão em 1986, estabelecendo, entre outras coisas, que a decisão de instalar o sacerdote em questão na diocese não tinha sido tomada pelo Cardeal Ratzinger, nem era sequer do seu conhecimento, circunstância que não é propriamente de estranhar numa diocese grande, com uma burocracia complexa. A verdadeira questão deve ser, pois: o que leva um jornal alemão a decidir recuperar o caso, e trazê-lo à primeira página vinte e quatro anos depois?
  5. Uma pergunta desagradável – porque o simples facto de a colocar parece uma atitude defensiva, e também não consola as vítimas –, mas importante, é a de saber se um sacerdote católico corre, pelo facto de o ser, mais riscos de vir a ser pedófilo ou de abusar sexualmente de menores do que a maioria da população, duas situações que, como se viu, não são idênticas, porque abusar de uma rapariga de dezasseis anos não é ser pedófilo. É fundamental responder a esta pergunta, para descobrir as causas do fenómeno, e portanto para poder evitá-lo. De acordo com os estudos de Philip Jenkins, comparando a Igreja Católica dos Estados Unidos com as principais denominações protestantes, a presença de pedófilos é, dependendo das denominações, duas a dez vezes superior entre os pastores protestantes. A questão é relevante, porque mostra que o problema não é o celibato, dado que, na sua maioria, os pastores protestantes são casados. No mesmo período em que uma centena de sacerdotes católicos eram condenados por abusos sexuais de menores, o número de professores de educação física e de treinadores de equipas desportivas jovens, também quase todos casados, considerados culpados do mesmo delito nos tribunais americanos atingia os seis mil. Os exemplos podem multiplicar-se, e não só nos Estados Unidos. E o principal dado a ter em conta, de acordo com os relatórios periódicos do governo americano, é o de que dois terços dos abusos sexuais a menores não são feitos por estranhos, ou por educadores – incluindo os sacerdotes católicos e os pastores protestantes –, mas por membros da família: padrastos, tios, primos, irmãos e pelos próprios pais. E existem dados semelhantes relativamente a muitos outros países.
  6. E há um dado ainda mais significativo, mesmo que politicamente incorrecto: 80% dos pedófilos são homossexuais, são homens que abusam de outros homens. E – voltando a citar Philip Jenkins – 90% dos sacerdotes católicos condenados por abusos sexuais de menores e pedofilia são homossexuais. Se a Igreja Católica tem efectivamente um problema, não é o do celibato, mas o de uma certa tolerância da homossexualidade nos seminários, que teve particular incidência nos anos 70, a época em que foi ordenada a grande maioria dos sacerdotes que foram posteriormente condenados por abusos. Um problema que Bento XVI está a corrigir com todo o vigor. De forma mais geral, o regresso à moral, à disciplina ascética, à meditação sobre a verdadeira e grandiosa natureza do sacerdócio, são os melhores antídotos contra a verdadeira tragédia que é a pedofilia; e o Ano Sacerdotal também deve ter esse objectivo.
  7. Relativamente a 2006 – altura em a BBC emitiu o documentário de Colm O’Gorman, deputado irlandês e activista homossexual – e a 2007 – altura em que Santoro apresentou a respectiva versão italiana em Annozero –, não há, na realidade, grandes novidades, à excepção de uma crescente severidade e vigilância por parte da Igreja. Os casos dolorosos dos quais se tem falado nas últimas semanas não são todos inventados, mas sucederam há vinte ou trinta anos.

Ou talvez haja uma novidade.

Como se explica esta recuperação, em 2010, de casos antigos e muitos deles já conhecidos, ao ritmo de um por dia, atacando de forma sempre mais directa o Papa, um ataque aliás paradoxal, tendo em consideração a enorme severidade, primeiro do Cardeal Ratzinger, e depois de Bento XVI, relativamente a este tema?

Os «empresários morais» que organizam o pânico têm objectivos específicos, objectivos esses que se vão tornando cada vez mais claros, e que não são a protecção das crianças.

A leitura de certos artigos permite compreender que – na véspera de escolhas políticas, jurídicas e mesmo eleitorais que, um pouco por toda a Europa e pelo mundo, põem em questão a administração da pílula RU486, a eutanásia, o reconhecimento das uniões homossexuais, temas em que a voz da Igreja e do Papa é quase a única que se ergue a defender a vida e a família – poderosos grupos de pressão se esforçam por desqualificar preventivamente esta voz com a acusação mais infamante, que é também, hoje em dia, a mais fácil de fazer: a acusação de favorecer ou tolerar a pedofilia.

Estes grupos de pressão mais ou menos maçónicos são uma prova do sinistro poder da tecnocracia, evocado pelo mesmo Bento XVI na encíclica Caritas in Veritate e denunciado por João Paulo II na mensagem para o Dia Mundial da Paz de 1985 (de 08.12.1984), quando se referia aos «desígnios ocultos», a par de outros «abertamente propagandeados», «com vista a subjugar os povos a regimes em que Deus não conta».

Vivemos realmente numa hora de trevas, que traz à mente a profecia de um grande pensador católico do século XIX, o piemontês Emiliano Avogadro della Motta (1798-1865), que afirmava que das ruínas provocadas pelas ideologias laicistas nasceria uma verdadeira «demonolatria», que se manifestaria de modo especial no ataque à família e à verdadeira noção do matrimónio.

Restabelecer a verdade sociológica sobre os pânicos morais relativamente aos sacerdotes e à pedofilia não permitirá travar este grupo de pressão, mas poderá constituir, pelo menos, uma pequena e devida homenagem à grandeza de um Pontífice e de uma Igreja feridos e caluniados porque se recusam a calar-se nas matérias que dizem respeito à vida e à família.

Fonte: LOGOS

5 comentários:

  1. The Myth of Pedophile Priests
    As more pedophile priest scandals blow up across Europe we should be ashamed of the offenders and those who sheltered them and oppressed the victims. The guilty should be weeded out, removed from office and handed over to the civil authorities where they are guilty of crimes. Systems to avoid abuse must be established and rigorously maintained, and victims should be justly compensated for their suffering.

    However, Penn State professor Philip Jenkins (who is not a Catholic) has written the most objective book on the subject, and he summarizes his arguments in this excellent article. In light of his work, we should remember some basic facts and principles:


    Priestly celibacy is not the issue - married men are more likely to abuse children than unmarried
    Most child abuse takes place within the home.
    All religious groups have pedophile scandals, and the Catholics (while the largest religious group) are at the bottom of the list statistically.
    Child abuse is prevalent in all areas of society: schools, youth organizations, sports, etc.
    Statistically, of all the professions, Christian clergy are least likely to offend. Doctors, Farmers and Teachers are the professions most likely to abuse children--not clergy.
    Among clergy offenders Catholic priests are least likely to offend.
    Catholic cases of pedophilia make more headlines because of anti Catholic prejudice and because the Catholic Church is bigger and more lucractive to sue.
    Pedophilia and Euphebophilia are different problems. The former is sexual attraction to pre-pubescent children. The latter is attraction to teenagers. Most cases branded 'pedophila' are actually 'euphebophila.'
    Most of the cases of euphebophilia are homosexual in nature, however the politically correct do not want this problem to be associated with homosexuality.
    The number of Catholic priests guilty of pedophilia is very small.
    What we now call 'cover up' was often done in a different cultural context, when the problem was not fully understood and when all establishment organizations hushed scandals. They did so for what seemed good reasons at the time: protection of the victims and their families, opportunity for rehabilitation of the offender, the avoidance of scandal to others. It is unfair to judge events thirty years ago by today's standards.
    When lawsuits are looming people smell money. We must be wary of false accusations.
    The accused must be entitled to a fair hearing. The church should insist on hard proof of the abuse, and for the sake of justice, ensure that the innocent are not prosecuted.
    When guilt is established the offender must be punished, not sheltered.
    Distinctions must be made between types of abuse. Some offenses are worse than others. Verbal abuse or corporal punishment during a time when that was acceptable, while lamentable, is not the same as sexual abuse or extreme physical abuse.
    Sexual abuse of an adult, or a sexually experienced older teenager is wrong, and damaging, and should be punished, but it is not the same as the sexual abuse of a younger, innocent child.
    Number of offenses must be considered. One lapse is not of the same seriousness as repeated, persistent and premeditated offenses.
    I am in no way wishing to be soft of pedophiles and those who covered for them, however justice and truth demand an objective analysis of the facts.
    Posted by Fr Longenecker at Monday, March 22, 2010

    Antonio (Brasil)

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  2. Chega deste tema! Não há mais nada que aflijam os padres inquietos excepto esta lama da pedofilia? Parece uma obcessão! Não será isto que os maçónicos querem?
    Com tantos problenmas e tantas causas humanas, estamos a comer o nosso umbigo.
    A pedofilia foi, é e será um crime. Por isso vale a pena chover no molhado?
    Com 20% da população portuguesa na miséria, com injustiças sociais que bradam ao Céu, com uma insegurança que arrepia, com os valores humanos na rua da amargura, com igrejas vazias, com injustiças gordas dentro da Igreja - dioceses com muitos sacerdotes e outras com tão poucos -, com desafios à fé nunca vistos, este blog só enxerga pedofilia?

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  3. A pedofilia existe desde o inicio da humanidade mas só agora dá luga a altos poleiros no Vaticano.

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  4. Sim sempre houve pedofilia, mas quem sabe realmente os que são inocentes e os que não são? Deixar de falar será solução? Ou falar em exagero?... Bem sabemos que os meios de comunicação têm tendência a empolgar, mas também é verdade que as vítimas existem. E quem foi vítima como eu não desejará e terá o direito de querer justiça?... na terra já que cá vivemos e quanto à do céu ficará para Ele.

    AC

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