Revisitando as imagens de Jesus, percebemos que todas elas se acumulam e complementam, sem que nenhuma nos permita tocar de maneira concludente o seu mistério. Perante a pergunta de Jesus, "e vós quem dizeis que eu sou?", sentimos, apesar de tantas respostas, que nos interstícios das nossas nomeações mantêm-se silêncios inapagáveis. De certa forma isso é o que se passa com todos os homens: somos acessíveis e também de uma inacessibilidade irredutível. Cada um é uma palavra e ao mesmo tempo um segredo. Aquilo que dizia Paul Valéry: "Estás cheio de segredos a que chamas eu, tu és a voz do teu desconhecido". 
A realidade de Jesus pode ser dita, proferida, enunciada, mas sentimos sempre que ela é inclassificável. 
O rosto de Jesus está continuamente a ser refeito. 
Pensemos, por exemplo, na sua iconografia. 
- Porque é que Jesus tem barbas? Porque os homens sábios daquela época eram representados assim.
 - Porque é Jesus figurado com aquele rosto de efebo? Porque os artistas influenciaramse pela tradição clássica.
 - Porque aparece Jesus com uma túnica com pregas? Basta aproximar os primeiros retratos cristãos dos sarcófagos com aquilo que era a arte grega do tempo, para constatarmos que as maneiras e os traços do sábio ou do filósofo serviram para desenhar a identidade de Jesus.
 
Mas o rosto de Jesus continua por decifrar.
No final do seu Evangelho São João escreve: "Há ainda muitas outras coisas que Jesus fez. Se elas fossem escritas, uma por uma, penso que o mundo não teria espaço para os livros que se deveriam escrever" (Jo 21,25). Ainda se podem escrever livros, contar novas histórias, percorrer outros caminhos. O rosto de Jesus permanecerá, pelo menos em parte, desconhecido, precisamente por oferecer a cada homem e a cada tempo a possibilidade de um (re)encontro.

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